sexta-feira, 17 de outubro de 2008

O Rebanho de Melancias

Contito do tempo do meu Avô O celeiro estava cheio de melancias, o ano tinha sido bom, não cabiam na loja e muito menos na despensa. Mantinha-se o hábito de todos os verões, acabada a refeição ouvia-se um António, vai buscar uma melancia. Ele, ou ele com a ajuda do irmão ou de uma das irmãs, ia ao celeiro e escolhia uma com tamanho suficiente para os que estavam à mesa. A mãe abria-a, alguém a provava e, se não prestava, era recambiada para a cozinha, onde mais tarde seria convertida em petisco para galináceos e porcos. As boas eram comidas pelos adultos e sorvidas pelos sete irmãos, até um sobrolho carregado lhes lembrar as boas maneiras. Depois de semanas a comer melancias, em geral boas, uma por outra aguada ou sensaborona, começaram a aparecer melancias com podridões. Umas vezes um pequeno podre que se cortava e não tinha importância, outras o podre já invadira uma superfície maior e pouco se aproveitava. Não era costume. Em anos anteriores nunca houvera tal praga de melancias podres. O que é, o que não é, até que a mãe, curiosa, começou a observar com cuidado as melancias estragadas e viu que todas tinham uma picadela, um pequeno orifício no sítio onde estava a parte apodrecida. Alto lá, isto não é natural, este buraquito em todas as melancias podres! E mais preocupada ficou quando se deu conta que eram muitas as melancias assim, um desperdício. O que foi, o que não foi, o marido também não sabia. Nem a prima Aurora e nem sequer o Tio Sebastião, o especialista máximo em melancias naquela casa. Até que um belo dia, ao almoço, ao abrir uma melancia grande, intragável e já com um buracão, a mãe perguntou: . - Alguém sabe porque é que a melancia está assim? Ficou de boca aberta ao ouvir o Zézinho dizer: . - Foi o mano que vacinou as melancias… Estava esclarecido o mistério! Dias antes, uma equipa veterinária tinha ido ao monte dos Ourives vacinar a vara de porcos e o Antoninho foi com o pai, viu todas as operações e aquilo ficou-lhe na cabeça. Como agarravam os animais, como enchiam a seringa, espetavam a agulha e lhes injectavam o líquido. No dia seguinte, surripiou uma agulha de fazer meia e recrutou o irmão Zé para seu ajudante. Foram para o celeiro e enquanto este segurava cada melancia como se de um bacorinho se tratasse, impedindo-a de espernear, o António, arvorado em veterinário diplomado, espetava a agulha na barriga da melancia. Ao tirá-la ainda lhe dava uma palmadinha no rabo dizendo, todo emproado: "É para fazer efeito mais depressa!" Vacinou as que pôde e só não espetou a agulha no resto da safra desse ano porque, entretanto, os chamaram para jantar. Foi uma sorte, pois se tem acabado a vacinação do rebanho de melancias, nesse verão já não haveria tal sobremesa em casa da D. Mariana Ruas. .

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