Ideologia salazarista da não-ideologia
No Estado Novo, versão oficial, não havia ideologia, apenas
os superiores interesses da nação. E a verdade é que toda a propaganda salazarista,
direito corporativo e direito administrativo incluídos, tudo fizeram para banir
essa palavra dos textos e da fala, do pensamento e da comunicação social.
Foi um longo tempo de ideologia salazarista injetada nos livros
e manuais, nos jornais e nas revistas como produto não ideológico. Porém,
evidente na escolarização reduzida aos mínimos, na neutralização e prisão de
pensadores, na censura de livros, jornais e jornalistas, no impedimento de
reuniões, no condicionamento industrial e no servilismo inoculado na reverência aos chefes e no subserviente pede
deferimento dos requerimentos.
Explosão
ideológica
Com o 25 de Abril tudo mudou: o vulcão expeliu ideologias
para todos os gostos e todas elas com todas as letras.
Mas aos poucos, assente a euforia, foram secas, ridicularizadas
umas, esvaziadas outras e mesmo ideologias ganhadoras foram metidas na gaveta.
Foi tempo dos empréstimos garantidos pelo ouro que nos obrigaram a depositar em
bancos estrangeiros. E também foi o tempo do primeiro FMI e da resignação nacional
ao pragmatismo de comer todos os dias. Parêntesis: até a Aspirina, a da Bayer,
chegou a faltar nas farmácias!
Nesta fase da história de Portugal, a desideologização foi
promovida sob a égide do livre mercado, dos "barões" novos-ricos e do
anestesiante "sindicalismo" PS-PSD. Exemplo da pretensa neutralidade
ideológica de tal tempo foi o milionário copo-de-água do casamente de uma filha
do "sindicalista" "socialista" Torres Couto.
Gente incómoda para o Clube de Bilderberg tem chamado a tal
tempo tempo de regabofe, tempo de peculato e de sinais de milagre, o milagre de
sinais exteriores de riqueza sem fonte plausível nem investigação eficaz.
Ideologia do deus-mercado
E eis que chega Passos… embora este capítulo já tenha vindo a desabrochar antes
dele, então com mais pezinhos de lã.
Ansioso por ribalta, peanha e cordelinhos, Passos empurrou
Sócrates borda fora a poder de PEC e mais PEC: o país, o país, o país… meu
querido Portugal! Tudo limpo, sem sombra de ideologia, aquela conversa de
plástico a que os químicos chamam PPC –
4-Fenil-4-(1-piperidinil)-ciclo-hexanol, mas que os cínicos puros sintetizam como
simples charlatanice.
Pois não é que o outro PPC, o agora Pedro do facebook, desenterrou a ideologia ao
enterrar os trabalhadores com mais 7% de TSU! Claro que a bem de todos nós, até
para benefício dos que ganham 485 euros e que ficarão com menos 34. Uma
ninharia, coisa que não ia impedir o "estadista" de cozinhar o bem
da arraia-miúda.
A tróica manda baixar os salários e o Pedro, seu pau
mandado, zás, não hesita em empobrecer os mais pobres dos pobres. Podia tirar
uns trocos aos grandes senhores, aos Amorins e aos Azevedos e até ficava bem no retrato se limasse um pouco dos milhões dos Mexias e dos senhores da
banca. E salvaria as aparências se fizesse uns desbastes nos figurões do PSD e
do PS que se instalaram nas empresas públicas a título de gestores e se pavoneiam
de BM topo de gama nos congressos partidários.
Mas não, a ideologia
Chicago boys falou mais alto. E é também ela
que o faz acabar com os subsídios de férias e de natal, manobra que mascarou
como distribuição pelos doze meses de um dos
subsídios reposto. É um pequeno balão de ensaio. Por ora restrito a um
setor laboral, mas a apalpar terreno para um passo maior.
É evidente que são passos da passada ideológica de
reinstalação da oligarquia do dinheiro grande. E do esmagamento da cidadania, pondo
a política ao serviço desse império, agenciada pelos políticos seus
serventuários.
Este todo-poderoso deus mercantil, alheio ao
desenvolvimento de uma economia assente em profissionais altamente qualificados
e tecnologias de ponta e indiferente ao bem-estar do povo é um caminho para o precipício. Que Passos embrulha em celofane
economês, mas que não passa de poeira de ultraliberalismo para olhos
incautos. Nem o recuo na TSU é tranquilizante, dada a sua rotineira tática da
mentir aos portugueses.
Nem para o americano médio o liberalismo selvagem será bom,
que as ruas USA estão cheias de sem-abrigo, esse desumano indicador de miséria extrema. E mesmo
na União Europeia dos altos PIB, IDH e Gini são mantidos esquemas de
solidariedade social que o experimentalismo Passos quer abolir, mascarado pela sua
requentada ideologia da não ideologia.
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