quinta-feira, 5 de julho de 2012

Subsídios e barbas alheias, direito e prepotência



Há defensores do exclusivo dos cortes dos subsídios de férias e de Natal aos Funcionários Públicos porque o Estado, seu patrão, não tem dinheiro.

E que tal cortar todos os salários dos Funcionários Públicos até o orçamento estar equilibrado!? Desta forma radical se reduziria o défice muito mais rapidamente… Seguindo essa argumentação seria tão legítimo tirar-lhes dois subsídios como ficar-lhes com todos os salários, confiscando-lhes os de Janeiro, Fevereiro, etc. etc. até ao último cêntimo do de Dezembro. Se não há dinheiro nos cofres públicos…

Essa é uma visão egoísta, inconstitucional e enviesada.

Egoísta porque os seus defensores, não sendo Funcionários Públicos, têm um apurado instinto auto protetivo: as barbas alheias que ardam, para que as suas não esturriquem.

Quanto à inconstitucionalidade, só lembramos a igualdade entre portugueses consagrada no artº 13º da Constituição de Portugal.

E é enviesada, porque os ditos subsídios, tal como os do resto dos trabalhadores portugueses, têm como fundamento alguma equidade na redistribuição dos recursos, muito para lá da conjuntura depressiva.


Vejamos o viés com mais detalhe.

O Estado, mesmo nas ideologias minimalistas, para cumprir a sua missão, tem gente a trabalhar nas mais diversas funções. Como desde o fim da escravatura se paga aos empregados, o Estado português também o faz.

E a remuneração reflete, em cada época, a cultura que norteia a sociedade. De facto, trabalho igual salário igual, justiça redistributiva e igualdade perante a lei, foram sucessivamente vertidos no ordenamento jurídico português. Por uma singela razão: para que esses padrões civilizacionais se refletissem na efetiva partilha da riqueza nacional pelos seus Cidadãos. Sejam eles funcionários do Estado ou de outras entidades!

Consequentemente, a estrutura salarial incorpora subsídios de férias e de Natal com caráter transversal a todo o país. Independentemente do setor, seja ele empresarial, público, agrícola ou industrial; até a Fundação Gulbenkian o adotou. Por isso os trabalhadores portugueses, todos eles, Funcionários Públicos e cirurgiões privados, professores do setor cooperativo, costureiras e mineiros de multinacionais alcançaram o histórico direito aos subsídios de férias e de Natal.

Subtrair essa remuneração aos Funcionários Públicos corresponde, portanto, à criação de um ilegítimo, inconstitucional e abusivo fosso entre estes profissionais e os restantes trabalhadores do país.

Tal excesso, assente na ideologia do liberalismo incontinente, mostra o desprezo grosseiro pelo equilíbrio social e retrata o descomunal abuso de poder do governo Passos. Com este mesmo desrespeito pelos Cidadãos só não corta nos outros meses porque sabe muito bem no que se metia, que a tolerância tem limites, pois o cinto deve apertar em todos.

É bem sabido que um dos símbolos mais relevantes das sociedades civilizadas atuais é a prevalência do direito sobre a arbitrariedade, em oposição à prepotência dos poderes medievais ilimitados. Por isso se instituíram como Estados de Direito.

Passos, porém, espezinhando esse direito e aviltando os respetivos princípios, fez uma brutal ofensa à dignidade dos portugueses que trabalham para o Estado. Inspirado, quem sabe, pela antecessora que defendeu a suspensão da democracia, o atual PM, passa dessa hipótese partidária à efetiva derrogação do Estado de Direito em Portugal. Tudo com retórica teatral, falinhas mansas, a bem da Nação…

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